sábado, 18 de junho de 2016

Memorando de Vincent Willow - Parte 2



Dia 43


Não tenho mais vontade de estudar. Estou ficando cada vez mais perturbado.

Pensei que fosse me acostumar com isso. É assustador. Meu corpo está ficando mais debilitado a cada dia. Essa rotina é desgastante. Já faz vinte e poucos dias que vi aquele grupo passando pela rua rumo ao norte da cidade. Eram cinco ou seis pessoas, não sei ao certo. Uma delas era uma mulher. Uma moça bem jovem como pude ver pela fresta. Carregava uma mochila, uma haste de metal e vestia roupas aparentemente pesadas como os outros do grupo. Pareciam já saber sobre os cuidados básicos. De repente, ela parou e ficou olhando para a minha janela. Acho que não me viu, mas deve ter desconfiado que houvesse alguém vivo aqui. Devia ter apagado a droga da lamparina ou colocado algo mais escuro nas janelas. Os outros do grupo se distanciaram, foi quando ela percebeu que estava ficando para trás. Apertou o passo e continuou sua travessia. Seguiram para o norte.

Foi por pouco. Não quero que ninguém saiba da minha existência aqui. Nesses tempos difíceis os humanos vivos são tão perigosos quanto as criaturas. Presenciei atrocidades durante meu trajeto até então. As pessoas perderam toda a noção que tinham sobre fraternidade e solidariedade. Racionalidade então, nem pensar. Todos com que esbarrei pelo caminho se não estavam saqueando ou agredindo, estavam surtando ou quebrando alguma coisa. Acho que foi aí que tudo piorou e se espalhou ainda mais rápido.

Estou andando sozinho já faz muito tempo. Não quero pensar que preciso de mais alguém. Isaac foi minha última companhia desde que perdi Alyssa. Ainda sinto vontade de morrer quando me lembro dela. O que me consola é que ela não se tornou uma daquelas coisas. Sofreu muito antes de morrer, mas não precisei vê-la cambaleando na minha direção sem saber quem eu era. Eu não aguentaria vê-la assim. Por sorte a pneumonia tirou-a de mim antes do pior, antes de tudo isso acontecer. Ela seria a noiva mais linda de toda a Pensilvânia.

Não posso dizer a mesma coisa do Isaac. Ele ficou quase setenta horas deitado, sendo queimado vivo pela febre alta, até que aos berros tive que trancá-lo no banheiro de uma pensão abandonada numa cidade do interior do Kentucky. Não sei o porquê, mas não me lembro do nome do lugar. Acho que foi a pior parte da viagem. Não tive coragem de acabar com o sofrimento de Isaac. Ele não merecia isso, me ajudou muito no caminho. Não sei se estaria vivo se não fosse por ele. Certo ou errado, eu não consegui acabar com ele.





.......

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente aqui sobre a leitura...